Uma crítica ao fenômeno que emociona, conforta e, ao mesmo tempo, levanta sérias questões sobre os limites entre afeto e ilusão.


O que são os bebês reborn?

Imagine um bebê tão realista que, à primeira vista, engana até os olhos mais atentos. Pele com textura, veias, cílios implantados à mão, cheirinho de talco, peso realista. Mas... ele não respira. Não chora. Não cresce.

Esse é o bebê reborn — uma boneca hiper-realista que nasceu da arte e, ao longo dos anos, ganhou espaço como brinquedo, peça de coleção e até instrumento terapêutico.

Mas... até onde isso é saudável?


Terapia ou fuga da realidade?

Não é difícil encontrar relatos emocionantes: mães que perderam filhos e encontraram nos reborns um alívio; idosos com Alzheimer que, ao segurarem esses bonecos, reativam memórias de carinho e cuidado.

Mas também não é difícil encontrar vídeos que viralizam com adultos dando mamadeira para bonecos, levando-os ao pediatra, tentando usar os reborns para acessar benefícios públicos — e aí, o assunto muda de tom.

Quando o consolo se transforma em negação da realidade, ultrapassamos a linha tênue entre saúde emocional e delírio afetivo.


A romantização nas redes sociais

A estética do Instagram potencializou o culto ao reborn: vídeos de “rotina com o bebê”, "primeira papinha", "banho da manhã", "look do dia". E os comentários? Mistura de encanto e incômodo.

Será que estamos nos acostumando com uma realidade fabricada? Será que o excesso de apego a uma boneca não revela um buraco emocional profundo?

O reborn pode até parecer inofensivo. Mas a idealização do “bebê perfeito” — que não chora, não exige, não cresce — talvez diga mais sobre a nossa sociedade do que gostaríamos de admitir.


E os limites éticos?

Recentemente, o tema chegou ao Congresso Nacional. Projetos de lei tentam coibir o uso indevido dessas bonecas para fraudes. E a discussão vai além: devemos permitir que adultos simulem uma maternidade falsa publicamente, como se fosse algo saudável?

Não se trata de proibir, mas de refletir: estamos diante de uma ferramenta terapêutica ou de um sintoma social?


A crítica final

O reborn é, sim, uma obra de arte. É delicado, é belo. Mas também é um espelho — que reflete carências emocionais, traumas não curados, um desejo quase desesperado de controle sobre aquilo que, na vida real, é caótico: a infância, o afeto, a perda.

E talvez o problema não esteja no boneco em si, mas em tudo o que projetamos nele.


 

Porque no fundo, a pergunta que fica é: estamos buscando afeto… ou tentando evitá-lo em sua forma mais verdadeira e imprevisível?